14/02/2021

Dever de informação no contrato de seguro

O contrato de seguro é aquele pelo qual o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados (artigo 757 do Código Civil) .

O contrato de seguro é um contrato típico e, apesar de regulado pelo Código Civil, o Código de Defesa do Consumidor insere a relação securitária entre as de consumo, conforme artigo 3º § 2°, que diz “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária…”

O dever de informar tem uma importância fundamental no contrato de seguro e é imposto a ambas as partes.

Segundo o artigo 765 do Código Civil, o segurado e o segurador são obrigados a guardar, na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.

Dessa maneira, a seguradora precisa confiar nas informações prestadas pelo segurado para avaliar o risco, estabelecer o valor do prêmio, emitir a apólice e suas condições, ou até mesmo, recusar a proposta.

A operação de seguros segue uma série de regras técnicas que viabilizam a avaliação dos riscos, quando o segurado omite informações ou relata fatos não verdadeiros, isso causa um desequilíbrio na relação contratual, sendo a taxação do prêmio desproporcional ao risco assumido pela seguradora.

Essa conduta afeta diretamente o fundo comum e obriga a seguradora a suportar com pagamentos superiores a sua capacidade técnica, podendo acarretar a insolvência da seguradora.

O dever de informação também deve estar presente na execução do contrato, assim havendo qualquer alteração no decorrer do contrato que mude o risco, o segurado deve informar imediatamente a seguradora.

Conforme mencionado, o Código de Defesa do Consumidor insere a relação securitária entre as de consumo e determina em se artigo 6º como sendo direito básico do consumidor a obtenção de informação adequada sobre diferentes produtos e serviços, como a especificação correta de quantidade, as características, a composição, a qualidade, os tributos incidentes e o preço, incluindo os eventuais riscos que tais produtos ou serviços possam causar.

Desta forma, é direito básico do consumidor a transparência na relação contratual, bem como o repasse de todas as informações necessárias para o bom andamento do contrato.

A seguradora deve observar a clareza e a transparência em seus clausulados de modo que o consumidor comum possa entender aquilo que está contratado.

Os riscos excluídos devem constar nas condições gerais com letras legíveis e de forma objetiva, específica e inequívoca, de modo a não suscitar dúvidas sobre seu alcance.

A previsão de exclusão de risco não fere os direitos do consumidor, pois está em consonância com a função da operação de seguro e por isso é admissível pela lei consumerista ,lembrando que o clausulado exige por parte da seguradora protocolo perante o órgão regulador, para prévia aprovação.

A informação fornecida com a mais estrita boa-fé e veracidade dissipam dúvidas e incertezas, atingindo a função social do contrato de seguro.

Podemos citar como exemplo da importância da informação no contrato de seguro de vida.

O segurado deve responder o questionário da proposta com veracidade dando oportunidade para a seguradora de avaliar se há doença pré-existente ou não.

A seguradora entendendo necessário, poderá solicitar exames médicos antes da contratação para avaliar o risco.

Veja que recentemente o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 609 que diz;

Súmula 609: A recusa de cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente, é ilícita se não houve a exigência de exames médicos prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado.

Nesse caso, a seguradora apenas terá ciência da doença para solicitação de exames se o segurado informar com veracidade a sua condição de saúde.

Havendo omissão intencional do proponente/segurado na contratação do seguro, este terá a sanção civil prevista no artigo 766 do Código Civil.

“Se o segurado fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido.”

Nesse sentido, seguem alguns entendimentos jurisprudenciais;

 “SEGURO DE VIDA INDIVIDUAL. DOENÇA PREEXISTENTE NEGATIVA DE COBERTURA. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. Uma vez demonstrado pela prova documental e testemunhal que a segurada era portadora de moléstia gravíssima, – câncer uterino, há pouco extirpado -, quando da contratação do seguro, e tendo tal fato omitido ao preencher o cartão-proposta, justificada se mostra a recusa da seguradora ao pagamento da indenização perseguida. A omissão falsa ou a omissão intencional são inadmissíveis no contrato de seguro porque afastam o próprio risco, a álea, que é elemento essencial desse contrato. Exegese do 1.444 do CC de 1916. Litigância de má-fé”. (TJ-RS – Ac. Unânime da 6ª Câmara Cív., publ.em 08.10.2007 – Ap. Cív. 70015735038 – Rel. Des.Osvaldo Stefanello).

 

“SEGURO DE VIDA. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. BENEFICIÁRIA. r. sentença fundamentada, mantida e acolhida, como razão de decidir, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste Egrégio Tribunal de Justiça. Conhecimento do Segurado sobre doenças preexistentes e omissão quando da contratação do seguro. Omissão voluntária e que poderia influenciar na aceitação ou não da proposta e no valor do prêmio. Perda do direito à indenização securitária. Reconhecimento. Recurso da Autora não provido”. (27ª Câmara de Direito Privado do TJSP  –  Apelação com Revisão nº 9076053-88.2008.8.26.0000 – rel. Des. Berenice Marcondes Cesar – j. 14.02.2012).

 

“EMENTA: Seguro de vida e acidentes pessoais. Ação de cobrança.1. Doença preexistente de conhecimento inequívoco do segurado, sendo causa de exclusão do seguro, obsta o pagamento da indenização respectiva. 2. As declarações constantes do cartão-proposta, feitas pelo segurado contratante, devem corresponder à verdade, eis que nortearão os termos da contratação. Resposta que não corresponde à verdade traduz-se em fato impeditivo do direito à indenização. 3. Negaram provimento ao Recurso”. (25ª Câmara de Direito Privado do TJSP – Apelação nº 9213879-59.2008.8.26.0000 – rel. des. Vanderci Alvares – j.  29.02.2012).

 Claro, a sanção somente é aplicada se a doença omitida tiver sido a causa direta do óbito ou da incapacidade, e se o segurado tinha ciência da doença na contratação do seguro.

Por fim, o consumidor deve ler a apólice e suas condições gerais de forma atenta e caso tenha dúvida ou precise fazer qualquer alteração procure o corretor de seguro. 

Graziela Vellasco – Advogada Especialista em Direito Processual Civil e Seguros, Previdência e Capitalização.Vice- Presidente da Comissão de Direito Securitário da 3ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (2019/2021)