04/08/2010

HOMICÍDIO NO TRÂNSITO: CULPA OU DOLO?

A lei brasileira não define de forma clara e nossa doutrina não é pacífica como enquadrar um atropelamento com morte, decorrente de um racha.Pode ser um homicídio doloso (com intenção de matar ou assumindo o condutor risco da morte) ou culposo (acidental) . Essa tema apresenta uma zona cinzenta entre o chamado dolo eventual e a culpa consciente , pois não há posição fixada quer pela Doutrina, quer pela Jurisprudência .
Uma corrente de doutrinadores chega a sustentar que nunca existe dolo eventual em homicídio no trânsito. No entanto, é bom esclarecer que o dolo direto existe quando alguém, no volante de um carro, deliberadamente mata outrem .
Todavia, a diferença de enquadramento entre dolo e culpa é imensa. Na culpa consciente, o motorista imagina o resultado do seu ato , mas não admite que este resultado possa ocorrer, agindo assim com imperícia, imprudência ou negligência .Neste caso, enquadra-se o condutor no no Art. 302, do Código Brasileiro de Trânsito (CBT) , como homicídio culposo, o qual é decidido pelo juiz singular, sujeito a pena de 2 a 4 anos.
Já no dolo eventual, o motorista prevê o resultado e o admite, sem buscar evitá-lo. Portanto, assume o risco de produzí-lo. Esse é o homicídio doloso, previsto no Art. 121 do Código Penal, que está sujeito a pena de 6 a 20 anos ou de 12 a 30 anos, se for qualificado, sendo julgado pelo Tribunal do Júri.
Nos últimos anos, vem se registrando uma tendência de endurecimento do sistema repressivo do Estado, inclusive na aplicação da legislação de trânsito. Verificar-se atualmente que nas ocorrência de trânsito com morte, enquadra-se mais como homicídio doloso do que como culposo. Aliás, como aconteceu em Brasília ,em 2007, quando um motorista que dirigia alcoolizado e em alta velocidade foi a Júri por ter invadido o eixão sul e atropelado e matado um ciclista de 25 anos, sem prestar socorro à vítima.
O simples racha, no qual não haja vítima já é crime, sendo tipificado no Art. 308 do CBT, sujeito a pena de 6 meses a 2 anos. O racha potencializa o risco de danos a terceiros, podendo ferir e até matar pedestres e outros condutores.
A violência no trânsito, que leva a tantas mortes, além do problema criminal é acima de tudo um problema cultural.
Fonte: Luiz Flávio Borges D”Urso, advogado criminal, mestre e doutor pela USP, é presidente da OAB SP. Artigo publicado no jornal ” O Estado de S. Paulo” de 22/7/10