02/05/2025

A Impenhorabilidade do Capital Segurado: Evolução Legislativa e Jurisprudencial face à Lei Nº 15.040/2024

A Impenhorabilidade do Capital Segurado: Evolução Legislativa e Jurisprudencial face à Lei Nº 15.040/2024

Introdução

O tratamento jurídico conferido ao capital estipulado em contratos de seguro de vida, especialmente no que tange à sua penhorabilidade para quitação de dívidas do beneficiário, tem sido objeto de debates e evolução tanto na legislação quanto na jurisprudência. O Código Civil de 2002 estabeleceu uma proteção inicial, posteriormente interpretada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A nova lei do seguro ( Lei Nº 15.040, de 9 de dezembro de 2024), introduz uma nova diretriz que promete redefinir o entendimento sobre o tema.

O Código Civil e a Proteção Inicial

O Código Civil de 2002, em seu artigo 794, já dispunha que: “No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.” Esta disposição visava proteger o capital destinado ao beneficiário das obrigações deixadas pelo próprio segurado, garantindo a natureza assistencial do seguro. Contudo, a redação não era explícita quanto à penhorabilidade do valor recebido pelo beneficiário para quitar suas próprias dívidas.

A Interpretação do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Diante da lacuna interpretativa, o STJ no julgamento do Recurso Especial Nº 1.361.354 – RS, a Terceira Turma firmou entendimento de que a indenização securitária recebida pelo beneficiário possuiria natureza alimentar.
Com base nessa premissa e aplicando por analogia o artigo 649, inciso X, do Código de Processo Civil de 1973 (que estabelecia a impenhorabilidade da quantia depositada em caderneta de poupança até o limite de 40 salários mínimos), o Tribunal decidiu pela impenhorabilidade dos valores recebidos a título de seguro de vida até o referido limite. Os valores excedentes a 40 salários mínimos, contudo, poderiam ser objeto de penhora para satisfazer créditos contra o beneficiário.
Essa decisão buscou um equilíbrio: proteger o mínimo existencial do beneficiário, reconhecendo o caráter alimentar presumido da verba, mas sem criar um escudo absoluto que pudesse ser utilizado para frustrar credores quando o montante recebido fosse significativamente superior às necessidades básicas. No caso concreto analisado (REsp 1.361.354/RS), a beneficiária havia recebido aproximadamente R$ 40.000,00.

A Nova Lei do Seguro (Lei Nº 15.040/2024)

A Lei Nº 15.040/2024, que institui o novo marco legal para os contratos de seguro, traz uma disposição específica e assertiva sobre o tema. Seu artigo 122 determina: “Os capitais segurados devidos em razão de morte ou de perda da integridade física não implicam sub-rogação, quando pagos, e são impenhoráveis.”

A redação é clara e direta ao afirmar a impenhorabilidade dos capitais segurados, sem estabelecer limites ou exceções como fez a jurisprudência do STJ com base na legislação processual anterior.

Repercussões da Nova Lei na Jurisprudência

A entrada em vigor do artigo 122 da Lei Nº 15.040/2024 terá repercussão direta e significativa no entendimento consolidado pelo STJ. A nova lei, ao positivar de forma expressa a impenhorabilidade do capital segurado devido em razão de morte (ou perda da integridade física), parece superar a interpretação que admitia a penhora parcial acima de 40 salários mínimos.

O legislador optou por conferir uma proteção mais robusta ao beneficiário, alinhando-se à corrente doutrinária que defendia a impenhorabilidade total da verba em razão de sua finalidade alimentar e protetiva. A nova norma não condiciona a impenhorabilidade a limites de valor ou à comprovação da necessidade pelo beneficiário, estabelecendo-a como regra absoluta para os capitais oriundos desse tipo de sinistro.

Conclusão

A Lei Nº 15.040/2024 representa um marco na proteção dos beneficiários de seguros de vida e de acidentes pessoais. Ao determinar inequivocamente a impenhorabilidade dos capitais segurados devidos por morte ou invalidez, a nova legislação afasta a possibilidade de constrição desses valores para pagamento de dívidas do beneficiário, independentemente do montante.

Espera-se, portanto, uma revisão da jurisprudência do STJ, que deverá se adequar à nova e mais protetiva disposição legal, consolidando a natureza essencialmente alimentar e impenhorável desses benefícios.

Graziela Vellasco

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1709342&num_registro=201300016734&data=20180625&formato=PDF